terça-feira, 13 de outubro de 2015

Depois que eu partir.

Toda criação perdera a certeza do brilho. Todo animal rosnava sofrimento. Toda árvore gemia de dor. Toda ave trinava desamor. Uma torturada e lenta sensação de tudo. Eis que eu sentia o fundo do sentir. Dor antiga atingira meu peito nesta hora em que tudo dorme. Oh, silêncio, eu te saúdo, rendido ao teu domínio. Oh, véu puro da noite, eu te saúdo, teu fulgor é a vivência. Até fingi ser livre, mas minha alma violada era presa em uma fina fumigação do pensamento. Foi num domingo, sentando a beira de um rio, que meu coração parou. Primeiro ele enfraqueceu seu ritmo, e pouco a pouco foi parando de bater. Parei de respirar. O corpo estremeceu por completo. Senti-me sufocado. A negritude da morte encobriu tudo em minha volta. Onde é que estava a vida? Tudo estava sobrando agora. Meu corpo magríssimo, de pernas cumpridas. As mãos suadas, e os olhos entreabertos. Onde é que eu existo agora? Se não para fora de mim. Onde a sensação ultrapassa tudo. Onde o corpo perdera o sentido. E sem sentido nada encontra motivo. Oh, silêncio, eu te saúdo, rendido ao teu encanto. Entre mim e você existe a calma. Uma infinita calma. Existe a infinita jornada muda e tola que o pensamento encobre. Existe o que guardei das manhãs cinzentas. Existe a chuva fina que envolvera minha existência. Então o meu corpo esvai-se. A pele esquece-se do prazer que é a vida. E agora minha alma existe onde há a frieza e, o vazio do fim. Sem contorno o sentimento não vale nada. E sem a vida muito menos. O que é mesmo viver? Esqueci-me da calma. Ela é uma criança que chora. Um susto da existência do que fui. Uma claridade, a realidade, do que agora eu sou. Minha alma antagonista venceu o corpo. Corpo que nunca foi meu. Corpo que ali continuara na beira do rio, que no contato com a terra se desfará em pó. Em mim tudo secou. Porque é no fim que descobrimos que nascemos para morrer.


® Thiago França Bento/2015.

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